sábado, 29 de agosto de 2009

ELEIÇÕES; NA HORA DE MUDAR

Interrogo-me, cada vez mais e cada vez com mais veemência, se me assiste o direito de levar este país a brincar, entrando no “faz de conta” em que se tornou a nossa vivencia, surripiando todas as razões que devia esgrimir como cidadão presente e, contrariamente, agir no sentido da defesa de uma posição consciente e consequente da denuncia do descalabro em que se tornou o nosso dia-a-dia, mormente o logro que representa o terem-nos, os políticos, como “coisa menor” no intervalo de todos os actos eleitorais, mas endeusando-nos nestes períodos muito concretos, como se todos sejamos pão para a boca, passando-nos totalmente de lado que no dia 28 de Setembro ou no dia 12 de Outubro voltamos a ser “carne para canhão”. Sinceramente, não vejo outra alternativa, e ainda que as mais diversas situações não me permitam outra postura, fico deveras apreensivo e preocupado com o rumo de tudo isto e não quero mais encapotar a ideia que detenho, com verdadeira raiva, que não escondo, da “palhaçada” deste Portugal confuso, atrasado, manietado e vilipendiado por pseudodemocratas que usam e abusam da nossa vontade, arvorando-se em arautos da liberdade. E, preocupa-me sobretudo, que este povo se disponibilize de forma perfeitamente irracional a dar cobertura a este mesmo vilipêndio constante.
Será possível que este povo continue entorpecido como se não lhe tenha bastado 48 anos do Estado Novo, continuando a apostar neste Novo Estado a que pouco falta para completar o mesmo período, sem soluções, sem inovação, sem desenvolvimento, sem provocar o bem-estar porque todos almejámos na noite do 24 de Abril?
Não me conseguem vender como única solução política o bipartidarismo, nesta sempre insistente ideia do bloco central, como se outras alternativas não se nos deparassem e o nosso fadário se esgote em ter de se votar num destes dois partidos para o bem colectivo.
E, nem sequer me vou deter a enumerar todos os escândalos de que temos sido contendores e que nos têm lacerado de forma contundente, infligindo-nos este castigo permanente que quase nos leva a acreditar que somos um país sem saída, tão-somente porque acredito que é chegada a hora deste povo se encontrar, pesando seriamente o seu passado recente, de literal falência a todos os níveis, e ponderar o futuro, que não se confina em nós, mas que pode ter gravíssimas repercussões nas gerações vindouras, de cuja responsabilidade não nos podemos demitir. E não haverá suficientes redenções ou actos de contrição para a verdadeira emancipação deste povo, enquanto não nos centrarmos neste princípio basilar; As governações do PSD e do PS já nos provaram, com elevados custos, ao longo de todos estes anos, aonde nos conduzem, o que me leva a repensar seriamente, porque abster-me ou votar em branco, nunca, a quem confiarei o meu voto nos próximos actos eleitorais.
Honra-me, cada vez mais, ser um homem de esquerda: um homem que viveu o pós guerra, o longínquo mas sempre presente ano de 1958 em que Humberto Delgado ganhou as eleições, os inolvidáveis anos sessenta; o Maio de 68, os Beatles, o Woodstock, a Guerra Colonial (na carne), a Ala Liberal de Sá Carneiro a Miller Guerra, as conturbadas eleições de 69 e 73 e uma quantidade infinda de outras situações político-sociais que talvez se não repitam mas que contribuíram enormemente para as grandes transformações que se operaram em Portugal. E nada do que citei me confere um estatuto especial, a não ser a deriva deste manancial de experiencia acumulada e que me permite não me rever nesta usurpação do poder a que assistimos, impávidos e serenos e por nossa exclusiva culpa, entregando deliberadamente em cada acto eleitoral o ouro ao bandido.
Sou e sempre fui apartidário mas desta vez voto Bloco de Esquerda. Coloco algumas reticências da sua capacidade de governação mas identifico-me com muitas das suas posições assumidas enquanto oposição, que me têm parecido sérias, eficazes e incisivas. É um voto na mudança!

terça-feira, 25 de agosto de 2009

QUANDO UNS JOSÉS SÃO VEIGAS E OUTROS NÃO

Mais de dois milhões de euros é quanto a Superfute, empresa de José Veiga deve ao fisco e que vão ficar por cobrar na sequência da anulação da falência daquela sua empresa de agenciamento, tão simplesmente porque o prazo de reclamação prescreveu. O advogado António Pragal Colaço, também ele credor de cerca de 16 mil euros por serviços jurídicos prestados, afirma que alertou o tribunal para a prescrição das dívidas e que pediu ao juiz do processo de falência que julgasse a litigância de má fé. Tal não aconteceu e nem a Administração Fiscal agiu após a anulação da sentença para reclamar os créditos.
O que se pode, fácil e tristemente concluir, desta (ou de mais esta) situação é que “Zés” há-os por aí às mãos cheias, aos quais o fisco não perdoa, indo-lhes às contas bancárias ou até 1/6 do vencimento, se estes forem os únicos bem penhoráveis, pouco importando se esses “Zés” e a sua família vão passar fome doravante.
“Josés Veigas” serão menos, mas sempre mais do que seria desejável, e deambulam por aí;- andam bem montados, banqueteiam-se à grande e à francesa, desfrutam as suas brutas casas, na cidade e na praia ou no campo e riem-se a bandeiras despregadas destes pobres “zés” sem cheta. Tudo isto porque temos o país, o governo e a justiça que temos.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

RAUL SOLNADO — COMEDIANTE

Luar surgindo a oeste no primeiro nome, sol a leste, no segundo, Raul tem 24 horas no onomástico. Nasceu num tempo em que tudo era ao vivo, mas, atento à tecnologia, fez-se logo carbono do ridículo, depois xerox do desprezível, afinal fax do presunçoso – e já tem para a holografia alguns truques humorísticos na manga. Lhe ensinaram que a vida é curta, por si mesmo percebeu que a vida é perto. E quando aprendeu que a vida é transmissível por via sexual sentiu logo enorme sentimento de culpa por seus gozos. Mas, com filhos em dois continentes, condena a incontinência. Feminista, finge de machão, na esperança de ser catequizado. Pra ele, homem e mulher continuam a ser círculos concêntricos num momento de tantos círculos excêntricos. Pois o homem pode ser o lobo do homem mas é, definitivamente, o poodle toy da mulher.
Generoso nato, nasceu mignon como solução para o problema demográfico – se todos fossem assim, caberia mais gente no mundo. Mas lembra que, com o mesmo material, Deus poderia fazer um homem bem melhor, aqui assim, nos ombros. Nasceu em Lisboa e, sem sair de Lisboa, vive hoje em Lismelhor. Português desde sempre, aceita o fado, mas nem tanto o destino. E depois de tudo o que aconteceu em Portugal ficou tão antimilitarista que não topa nem conversas generalizadas. Prudente, quando entra em enrascada o primeiro que faz é perguntar onde fica a saída. Gosta de ser considerado impagável, mas nunca na bilheteria. Tem extraordinária expressão corporal, toda no espírito. Decidido, quando vê uma bifurcação imediatamente segue os dois caminhos. Mas nunca foi sem voltar, daí o segredo de estar sempre. Menino-prodígio, aproveitou essa dádiva e reservou uns dias de infância para os anos de hoje. Ri pouco, faz rir muito, fala envolto num crepom de malícia, e todo o seu humor é anfiguri. Dentro de sua alma vibram jograis, saltam andarilhos, vivem polichinelos, cantam bufões, se escondem saltimbancos, bobos, truões, entremezistas, patuscos e pelotiqueiros, todos os palhaços do rei – de cuja sabedoria ele se apropriou pra ser o rei dos palhaços. Pois, pra ele, fazer rir é fácil – escapar com vida é que são elas. Acha que o teatro e a televisão se incompletam e o teatro é melhor, pois ninguém tem a coragem de desligá-lo no meio da piada. Acredita que o humor desarma o espírito, mas não tanto que possa desarmar Saddam Hussein.
Mas, depois de 100 milhões de Homo faber, 10 milhões de Homo sapiens, está certo de que, se o mundo não estourar no Golfo, chegou enfim nossa hora, a hora do Homo ludens.
Uma frase perdida: "A vida é sempre em volta". A pergunta metafísica: "Que fazer do homem que não gasta o destino?". Uma dúvida de fé: "Se Deus existe, por que nunca veio ver um meu espetáculo?". Epitáfio proposto: "Agora já é tarde".
E aí está o Raul feito e medido. Do Solnado eu nem falo.

P.S.: Raul foi meu amigo a vida inteira. A dele. Traidor, continuo na minha.


Escrito em 30/6/84 por MILLOR FERNANDES e publicado na revista VEJA em Agosto de 2009

REGRESSO

Esta minha ausência inusitada de quase um mês, não se ficou a dever a ter estado de férias, o que seria normal nesta época estival, nem a uma diminuição do afã que coloco neste blog, independentemente da qualidade do que escrevo e da quantidade de visitantes. Escrever é para mim um exercício mental, transformado numa prática assídua, tal e qual como os que necessitam da natação, da marcha, da corrida ou de outras ocupações físicas ou lúdicas, para se sentirem bem consigo mesmo. É Claro que não devo estabelecer um paralelo sem diferenciar tais práticas porque, obviamente quando escrevo e ouso publicar o que escrevo, tenho a consciência da exposição a que me submeto, sujeitando-me a críticas que só seriam evitáveis se escrevesse naquele caderno de apontamentos que guardo na mesa-de-cabeceira e a que ninguém tem acesso.
Mas, dizia eu, esta inesperada ausência fica-se a dever a um período conturbado que faz este mês um ano, em que me vi grego com um cálculo num dos rins e que culminou em duas intervenções cirúrgicas. Problema sanado, blog activo.
Tenho tentado, tanto quanto possível, neste entretanto, manter-me informado do que se vai passando aqui pelo “burgo” e creio haver matéria-prima bastante para por a escrita em dia. ESTOU DE VOLTA.