sábado, 12 de setembro de 2009

DIFICIL MAS JUSTO

Daniel Oliveira
Semanário "Expresso" de 12 de Setembro de 2009

Quando, em 2004, Bagão Félix acabou com os benefícios fiscais para os PPR elogiei a decisão. Não fui o único. Vital Moreira desenvolveu então bons argumentos a favor da medida. O tema voltou agora. De forma inesperada, ao debate público.
A imensidão de benefícios fiscais que pululam pelo nosso sistema cria problemas práticos e de principio. Os práticos: um sistema complexo ajuda à evasão fiscal, faz com que o Estado, gaste as suas energias a controlar minudências e só é eficazmente utilizado por quem tem mais informação ou dinheiro para pagar a um contabilista ou a um advogado. As razões de princípio são mais importantes. Quando o Estado devolve parte do investimento em PPR está a retirar do bolo fiscal dinheiro que deveria ir para o sistema público. Sabendo-se que a esmagadora maioria dos portugueses não pode investir em reformas privadas, está a desviar dinheiro ao SNS e ao ensino público, que é para todos, para subsidiar serviços a que só alguns podem aceder. Aliás, os argumentos contra as deduções são os mesmo que Sócrates usou, quando debateu com Portas, contra o plafonamento dos descontos para a segurança social ou o cheque-ensino nas escolas.
Como os mais pobres não têm qualquer possibilidade, e mesmo com as deduções, de ir a um médico privado ou por os filhos num colégio, eles estão, na prática, a pagar um serviço que lhes está interdito. Estão a pagar deduções que nunca poderão fazer. Os impostos, em vez de progressivos, passam a ser regressivos.
As deduções só são aceitáveis em serviços que o Estado não consegue prestar. E o dinheiro que se poupa na sua redução permite garantir ensino e saúde realmente gratuitos. É fácil explicar aos que usam essas deduções e que estão longe de ser ricos que elas não são justas e atrasam a criação de serviços públicos de qualidade que também são para eles? Não. Mas quem julga que ser de esquerda é defender o que é fácil engana-se.

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